Redação
Investigado por um suposto esquema de transferência fraudulenta de títulos eleitorais e de compra de votos na eleição de Mangaratiba (RJ), o prefeito eleito Luiz Claudio Ribeiro (Republicanos) construiu ampla vantagem sobre seu rival nas novas seções de votação que tiveram de ser abertas no município, devido à explosão de eleitores neste ano. Levantamento do GLOBO mostra que, nas 28 seções eleitorais que não existiam em 2020, Luiz Claudio teve 1,6 mil votos a mais do que o outro candidato na disputa, Aarão de Moura Brito (PP). A vantagem é mais de dez vezes superior aos 125 votos de diferença que decretaram a vitória de Ribeiro no primeiro turno.
Apoiado pelo atual prefeito Alan Bombeiro, Luiz Claudio foi o mais votado em 85% das novas seções eleitorais — cada seção corresponde a uma urna. Em algumas dessas urnas, o candidato do Republicanos chegou a ter 188 votos de vantagem para Aarão. Nos mesmos locais de votação, urnas “antigas” deram mais votos ao candidato de oposição.
Na Escola Municipal Maria Augusta Lopes, por exemplo, no centro de Mangaratiba, Aarão foi o vencedor nas quatro seções eleitorais que já existiam em 2020, totalizando uma vantagem de 151 votos. Luiz Claudio, por sua vez, venceu na seção nova, com 27 votos de vantagem.
O fenômeno se repetiu em um colégio municipal no distrito de Conceição de Jacareí, onde Aarão foi o vencedor em cinco das seis seções antigas, com uma vantagem total de 95 votos. Nas duas urnas novas, porém, Luiz Claudio obteve 82 votos de vantagem.
As diferenças ficam ainda mais amplas no distrito de Itacuruçá, o mesmo onde Luiz Claudio declarou seu domicílio à Justiça Eleitoral. Na escola municipal Cecilia Ferraz, por exemplo, o candidato do Republicanos venceu em todas as dez seções eleitorais. Nas seis seções antigas, a diferença para Aarão totalizou 166 votos. Nas quatro seções novas, a vantagem foi de 629 votos.
Em nota, a campanha de Aarão disse ter mencionado a “disparidade dos resultados nas seções eleitorais mais recentes” em uma notícia-crime apresentada ao MP Eleitoral, e alegou que os dado “destoa significativamente do padrão histórico”.
Procurado pelo GLOBO, Luiz Claudio respondeu, em nota, que considera “inverossímil” que as transferências de títulos eleitorais tenham beneficiado “exclusivamente” o candidato eleito. Ele afirmou ainda que as mudanças de domicílio de votação são “supervisionadas pela Justiça Eleitoral”, e disse que “indícios de irregularidades” antes da eleição foram sanados pelo Ministério Público (MP) Eleitoral — que indeferiu 1,4 mil pedidos de transferência no início deste ano.
Desde 2022, o município ganhou mais de 7 mil novos eleitores, o que fez o número de votantes chegar a 46,8 mil pessoas neste ano — superando à população estimada pelo IBGE, de 43,6 mil.
A presença de mais eleitores do que habitantes não é, por si só, irregular. A legislação permite que alguém registre como domicílio eleitoral uma cidade onde tem, por exemplo, apenas casa de veraneio. No entanto, o Tribunal Regional Eleitoral do Rio (TRE-RJ) afirma que “há um pedido de revisão do eleitorado de Mangaratiba em tramitação na Vice-Presidência e Corregedoria Regional Eleitoral”. A revisão pode ser determinada quando “o número de transferências eleitorais em um ano exceder em 10% o do ano anterior”, o que ocorreu na cidade.
Quatro inquéritos
Segundo o MP, estão em curso três inquéritos que apuram a suposta transferência fraudulenta de títulos para Mangaratiba e um inquérito sobre possível compra de votos. Há ainda uma ação eleitoral, que corre sob sigilo, instaurada a partir de notícia-crime de Aarão após o revés nas urnas.
Em nota, o MP afirma que um dos objetivos dos inquéritos é apurar se a “grande quantidade de transferências” de títulos eleitorais para a cidade ocorreu “em razão da atuação de apenas um candidato”.
“As novas seções eleitorais foram criadas, ao longo dos últimos dois anos, em razão do aumento do número de eleitores em decorrência dos pedidos de transferência de domicílio eleitoral, pois cada seção comporta um número limite de votantes”, diz a nota.
Reportagem da TV Globo, anteontem, revelou um diálogo entre uma moradora de Campo Grande, na Zona Oeste do Rio, que diz ter transferido o título eleitoral para Mangaratiba, com um homem que se apresenta como “responsável pela logística” para levá-la à cidade no dia da votação. O homem diz que vai “viabilizar o valor do Pix” e a orienta a votar em Luiz Cláudio. Segundo a reportagem, a eleitora diz ter recebido R$ 150.
Com informação do Globo